segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Indie: entre uma boa história e a perfeição técnica


“Hollywood se tornou corporativa. A mentalidade dos grandes estúdios transformou o cinema mais em um negócio do que em uma forma de arte, no qual cifras podem ser encontradas nos olhos das pessoas mais do que cataratas. Enquanto isso, filmes bem escritos, com personagens ricos, recebem um ombro frio e a outra face, e são forçados a dar lugar a filmes como “Velozes e Furiosos 6: com carros, explosões e ofertas de produtos.”
O trecho acima foi retirado de uma crítica notável — embora não exatamente original — sobre a imensa prensa de filmes hollywoodiana. Trata-se aí do clássico embate entre dois lados, não importando muito o nome que você atribua a cada um deles. “Arte” e “entretenimento”. “Rentabilidade” e “criatividade”.
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De qualquer forma, o que é destacado ali é incrivelmente simples: tem-se dinheiro (e a necessidade de fazê-lo) de um lado e um genuíno esforço criativo de outro — o tipo, digamos, mais ocupado em “contar uma boa história” do que em estufar um cofre com volumes cavalares de dólares.
Mas esse segundo grupo paga um “preço” considerável: precisa, por um lado, enfrentar o estranhamento do público e o “temor” relacionado a algo novo — em vez do lugar de conforto das fórmulas mais conhecidas (“explosões” e “carros”, digamos). E, por outro, precisa ter um jogo de cintura invejável para contornar limitações financeiras que fazem toda a produção funcionar com um “cobertor de pobre” — do tipo “puxa em cima, falta em baixo”.
Mas... Será que essa dinâmica fica mesmo restrita ao cinema? Não mesmo. De fato, quando se trata da indústria de jogos, a distância entre uma boa ideia e a sua realização como jogo traz um caminho, às vezes, ainda mais pedregoso.
Sim, é verdade que, assim como no cinema, há aí aquele espaço chamado como “indie”, o qual acaba agrupando propostas que, a princípio, não mereceriam ocupar um precioso espaço nas prateleiras.

Naturalmente, isso apenas ganha mais fôlego com as atuais possibilidades garantidas pelo mercado exclusivamente digital — o que acaba limando uma série de intermediários que, de outra forma, precisariam da sua cota de “faz-me rir”. Mas nem tudo é um mar de rosas e reconhecimentos aqui. Vale olhar isso mais de perto.

Os limites da indústria independenteO que faz um jogo ser “indie”?
O mercado de jogos independentes sem dúvida joga, de tempos em tempos, verdadeiras pérolas. São jogos como Braid, Limbo e Machinarium. Games que trazem em si uma óbvia dose de criatividade à flor da pele. Títulos que sem dúvida apanhariam terrivelmente se tivessem que atravessar toda a estratificação da burocracia que faz parte do caminho de um grande jogo.
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Senão, imagine como seria um Braid publicado com as pompas de um, digamos, Call of Duty: Black Ops 2. Ao final do processo, muito seria limado, enquanto um amontoado de “lugares-comuns” seria acrescentado, a fim de garantir o resultado financeiro. Em outras palavras, Braid não seria mais Braid.
Encontre um formato “barato”
Mas embora os desenvolvedores independentes contem com certa “liberdade criativa” para soprar vida em seus projetos, fato é que grande parte deles acaba trabalhando em uma verdadeira “saia justa”. Trata-se, basicamente, de apostar em algo que seja, a um só tempo, criativo e “barato” — no sentido de se encaixar em finanças bastante restritas.
Isso simplesmente acaba por restringir consideravelmente os formatos que uma proposta genuinamente criativa pode assumir para se apresentar ao mercado. Em vez de um belo ambiente tridimensional, por exemplo, é provável que existam algumas fases bonitas em side scrolling. Sim, há quem tente fazer isso de outra forma... Mas nem sempre dá certo.
A criatividade deve caber na caixa registradora?O longo caminho entre o desenvolvimento e a publicação
Você já ouviu falar do jogo Lucius?  Não? Ok, não se sinta culpado por isso. Trata-se, é verdade, de um jogo relativamente pequeno. Entretanto, Lucius chamou muita atenção pela sua proposta inegavelmente impopular: o protagonista, um garotinho de seis anos, é possuído pelo próprio Diabo, passando então a matar (com requintes de crueledade) cada um dos membros da sua numerosa família — sem se esquecer de empregados glutões e ranzinzas.
Para todos os efeitos, Lucius é um jogo independente. Embora a história tenha uma inspiração óbvia nos filmes da série “A Profecia”, a trama controversa acaba por reduzir o apelo do título a um nicho bastante específico de jogadores. O problema? Lucius tentou trazer um enorme ambiente tridimensional para vender um “peixe” inegavelmente cult — na falta de um termo melhor.
Como resultado — confira a análise clicando aqui —, todas a boa atmosfera sombria pretendida pela desenvolvedora acabou naufragando entre gliches, quebras de texturas e uma I.A. (inteligência artificial) digna de um pé de couve.
Um passo (tridimensional) maior do que perna
A conclusão é razoavelmente óbvia: a Shiver Games tentou alçar a sua proposta “diferente” ao mesmo espaço de jogos grandes. Ao dotar Lucius de um ambiente tridimensional interativo e ensaiar um sandbox (guardadas as devidas proporções), a pequena desenvolvedora deixou o espaço honorário reservado aos games indie para disputar, de “igual para igual”, com pedradas como, digamos, Silent Hill, Resident Evil ou mesmo (vá lá) Grand Theft Auto.
A diferença? Cada um dos blockbusters acima mencionados contou com dezenas, às vezes centenas de encarregados, cada qual respondendo por uma porção bastante específica do jogo. Ao final, o todo é juntado e se transforma no resultado final, o qual consumiu milhões de dólares e horas de trabalho — e isso deve, necessariamente, gerar frutos.
Entretanto, vale dizer: mesmo isso não serve de garantia para nada. Basta considerar Resident Evil 6, por exemplo. Independente da sua avaliação particular sobre o novo integrante da franquia, é fato que o empenho colossal da Capcom não necessariamente se converteu em um game inesquecível. Limbo, por exemplo, teve um investimento relativamente pífio e, mesmo assim, acabou reverenciado.
Não há uma solução fácil, é claro
Difícil acreditar que, em algum momento, estruturas monstruosas e “reinvenções da roda” vão simplesmente dar as mãos e partir em caminhada, gerando títulos ao mesmo tempo inovadores e tecnicamente perfeitos. Sim, é natural que o processo de desenvolvimento acabe barateando com o tempo — o que, bem ou mal, já aconteceu com o cinema e a indústria fonográfica.
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De fato, daqui a alguns anos, pode ocorrer que mesmo jogos pequenos consigam produzir com bem menos empenho colossos milionários tridimensionais do naipe de um GTA  Entretanto, em um mercado regido por números, é difícil acreditar que materializar uma “ideia genial” acabe sendo tão fácil quando jogar na prateleira um produto com comprador certo.
Enfim, a dualidade “arte/entretenimento” pode, é claro, ter os seus limites borrados algum dia. Mas não deve desaparecer tão cedo.
Fonte: The Pendulum

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